Uma análise didática e objetiva sobre o surgimento, evolução e estrutura dos direitos fundamentais nas ordens constitucionais modernas.
O artigo apresenta uma exposição clara e estruturada sobre os direitos fundamentais, abordando sua distinção em relação aos direitos humanos, a trajetória histórica de sua afirmação jurídica e as quatro dimensões que compõem sua evolução. Explora ainda as características essenciais desses direitos — fundamentalidade, normatividade e aplicabilidade imediata — como pilares do Estado Democrático de Direito.
1. Centralidade dos Direitos Fundamentais
Os direitos fundamentais são o núcleo da ordem constitucional democrática. Estão ligados diretamente à dignidade da pessoa humana, funcionando como limites ao poder estatal e garantias mínimas do indivíduo. Sem eles, o Estado perde sua legitimidade e sua função essencial de proteger a liberdade, a igualdade e a justiça.
2. Diferença entre Direitos Fundamentais e Direitos Humanos
· Direitos fundamentais são os direitos humanos positivados na Constituição de um Estado.
· Direitos humanos possuem caráter universal e supranacional, sendo reconhecidos em tratados internacionais.
2.1. Direitos fundamentais são os direitos reconhecidos e positivados nas Constituições nacionais, com aplicação direta, imediata e obrigatória no âmbito interno dos Estados.
Exemplos típicos incluem:
– o direito à vida (art. 5º, caput, CF);
CF. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade
– a liberdade de expressão (art. 5º, IV, CF);
CF, art. 5º IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
– a inviolabilidade do domicílio (art. 5º, XI, CF);
CF, art. 5º, XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicia
– o direito ao devido processo legal (art. 5º, LIV, CF).
Art. 5, LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.
Todos esses direitos estão expressamente previstos na Constituição Federal brasileira e podem ser exigidos judicialmente, inclusive por meio de remédios constitucionais, como o habeas corpus ou o mandado de segurança.
2.2. Direitos humanos, por sua vez, são direitos universais, reconhecidos em tratados e convenções internacionais, com fundamento em valores ético-políticos como liberdade, igualdade e dignidade.
São voltados à proteção da pessoa humana, independentemente da nacionalidade ou do sistema jurídico interno.
Exemplos incluem:
– o direito de não ser submetido à tortura (art. 5º da Declaração Universal dos Direitos Humanos – DUDH);
Artigo 5° Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
– o direito à nacionalidade (art. 15 da DUDH);
Artigo 15° 1.Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade. 2.Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de mudar de nacionalidade.
– o direito à educação (art. 26 da DUDH);
Artigo 26° 1. Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional deve ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito. 2.A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das actividades das Nações Unidas para a manutenção da paz. 3.Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de educação a dar aos filhos.
– o direito de participação política (art. 25 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos);
Artigo 25. Todo cidadão terá o direito e a possibilidade, sem qualquer das formas de discriminação mencionadas no artigo 2 e sem restrições infundadas:
a) de participar da condução dos assuntos públicos, diretamente ou por meio de representantes livremente escolhidos;
b) de votar e de ser eleito em eleições periódicas, autênticas, realizadas por sufrágio universal e igualitário e por voto secreto, que garantam a manifestação da vontade dos eleitores;
c) de ter acesso, em condições gerais de igualdade, às funções públicas de seu país.
– o direito à igualdade entre homens e mulheres (Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher – CEDAW).
Art. 1º Para os fins da presente Convenção, a expressão "discriminação contra a mulher" significará toda a distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo.
3. Origem e Evolução Histórica
A história dos direitos fundamentais começa na Antiguidade, com as primeiras ideias de limitação do poder em Atenas e na República Romana.
Na Idade Média, surge a Magna Carta (1215), que limitou o poder do rei e reconheceu garantias aos nobres.
A positivação moderna dos direitos fundamentais teve dois marcos principais: a Declaração da Independência dos Estados Unidos (1776) e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da França (1789).
A declaração americana destacou-se pela efetividade normativa, ao vincular diretamente o poder legislativo aos direitos reconhecidos.
Já a declaração francesa enfatizou os ideais universais de liberdade, igualdade e fraternidade, voltados à reconstrução ideológica do Estado sob uma perspectiva democrática e igualitária.
4. As Quatro Dimensões dos Direitos Fundamentais
1ª Dimensão – Liberdades Individuais
Direitos como vida, liberdade, igualdade formal e propriedade. São direitos de defesa contra o Estado, exigindo abstenção estatal.
2ª Dimensão – Direitos Sociais
Direitos como saúde, educação, trabalho e previdência. Exigem atuação positiva do Estado, promovendo justiça social.
3ª Dimensão – Direitos Coletivos e Difusos
Inclui o direito à paz, meio ambiente equilibrado, desenvolvimento sustentável e autodeterminação dos povos. São direitos transindividuais, com titularidade coletiva.
4ª Dimensão – Democracia e Pluralismo
Abrange os direitos à informação, democracia participativa, acesso à internet e pluralismo político. Representa o futuro da cidadania ativa, com foco na inclusão e transparência.
5. Três Características Essenciais
Fundamentalidade
5.1. Formal: estão na Constituição, com proteção reforçada (ex: cláusulas pétreas).
5.2. Material: mesmo fora do texto, se integram ao sistema por seu conteúdo essencial.
5.3. Normatividade: São normas jurídicas obrigatórias, não apenas princípios programáticos. Geram efeitos imediatos e podem ser exigidos judicialmente. Aplicabilidade Imediata
Conforme o art. 5º, §1º da CF, todos os direitos fundamentais têm efeito imediato, dispensando regulamentação para produzir efeitos.
CF. art. 5º, §1º. As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
Ainda existem debates sobre o alcance prático, mas a regra geral é sua efetividade direta.
6. Considerações Finais
A evolução dos direitos fundamentais revela sua natureza cumulativa, agregando novas dimensões sem excluir as anteriores.
Constituem instrumentos de limitação do poder, garantias do indivíduo e fundamentos do Estado Democrático de Direito.
Compreender sua estrutura e desenvolvimento é essencial para preservar a justiça, a democracia e a dignidade humana em qualquer sociedade constitucionalmente organizada.
Luiz Fernando Cassiano de Freitas
Advogado • OAB/SP 325.286 • Atuante no Foro de Birigui - SP.